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    Síntese final da XXIV Semana de Estudos Teológicos Heal the World

    4 anos ago · · Comentários fechados em Síntese final da XXIV Semana de Estudos Teológicos Heal the World

    Síntese final da XXIV Semana de Estudos Teológicos Heal the World

    De 03 a 07 de Novembro de 2020 decorreu a XXIV Semana de Estudos Teológicos/Ciclo de Seminários, sob o título “Heal the world. Ecologia, Sustentabilidade e Humanismo”. O evento realizou-se em formato online, devido às restrições resultantes da pandemia do covid-19, após ter sido adiado e reagendado para a data em que finalmente ocorreu. Foi a quarta edição resultante de uma parceria entre a Escola Superior de Teologia e Ciências Humanas do Instituto Católico de Viana do Castelo (ICVC) e a Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Viana do Castelo (IPVC).

    (Não) estamos à beira da Catástrofe”

    O primeiro serão contou com a riquíssima intervenção do Prof. Paulo Magalhães, jurista e investigador em ecologia da Universidade do Porto, com a conferência “(Não) estamos à beira da catástrofe”. Partindo da expressão do Papa Francisco na Laudato Si’, “a nossa casa comum ainda não está construída”, Paulo Magalhães apresentou o projecto “Common Home of Humanity” e explicou que uma casa comum da humanidade seria “uma organização humana e uma construção jurídica que permita que os humanos vivam em harmonia com o sistema terrestre e entre eles”. O conferencista recordou que “enquanto que a vida existe há quatro mil milhões de anos, a espécie humana existe há apenas 200 mil anos e apenas nos últimos 12 mil anos o ser humano foi capaz de praticar a agricultura, porque até então as condições climáticas não o permitiam”. Os 500 milhões de Km2 do nosso planeta gozam de um padrão de estabilidade climática, no qual se identificam nove “planetary boundaries” ou limites planetários, entre os quais se destacam a mudança climática, a camada de ozono e a acidificação dos oceanos. Estes limites já começaram a ser ultrapassados e o padrão começou a alterar-se terrivelmente desde a revolução industrial e, particularmente, nos últimos 50 anos”. É a isto que é comum chamar-se o “Antropoceno” ou a era em que o homem está a alterar de tal forma o clima que está destruir progressivamente o planeta e a provocar uma verdadeira e inegável crise ecológica. Lamentavelmente o direito ainda está marcado por uma visão territorial e ainda não incorpora o conceito de “recurso natural intangível” (Simone Borg, 2009) ou “bem comum sem fronteiras” que é a delicada e preciosa estabilidade climática, dependente de tantos factores a nível planetário, mas especialmente do “trabalho intangível da Amazónia” ou “externalidades” que não valorizamos. Neste sentido, na sequência dos trabalhos de Elinor Ostrom (Nobel da Economia 2009), propôs que a ideia de condomínio, isto é, de propriedades individuais e nacionais que partilham áreas comuns que são de todos e pelas quais todos são responsáveis e para as quais todos devem contribuir, devia ser aplicada ao planeta, para a sua conservação, introduzindo o conceito de “bem comum sem fronteiras”. Terminou recordando aos presentes que “não somos apenas responsáveis pelo sistema terrestre, nós somos parte dele”. E, nesse sentido, “só nos conseguimos defender a nós, se defendemos o sistema. Não esqueçamos que o futuro é uma grande surpresa”.

    Ecologia e Cristianismo: Missão impossível?!

    A segunda noite foi a vez de ouvir o Francisco Ferreira, da Associação ambientalista Zero, com o tema “Ecologia e cristianismo: missão impossível?!”. Começou por recordar que o contexto da sua intervenção é dado pela Encíclica do Papa Francisco, “Laudato Si” de 2005, particularmente pelo seu subtítulo “sobre o cuidado da casa comum”. Recordou ainda os “17 Objectivos para o Desenvolvimento Sustentável” propostas pela ONU, a Cimeira de Paris e o “Ano Laudato Si” que o Papa propôs para este 2020. Sobre o texto pontifício, Francisco Ferreira disse que “a encíclica – que se integra no Magistério social da Igreja – é de uma acutilância enorme, na revisão da crise ecológica com grande rigor na exposição dos dados científicos mais actualizados, e, no entanto, numa linguagem simples”. Sublinhou o conceito de “ecologia integral, cultural e social” proposto pelo Papa, a defesa da justiça inter-geracional e os “dois ‘s’: sobriedade e suficiência”. Destacou que a encíclica pretende ter uma abrangência concreta e ampla porque “oferece propostas de diálogo e acção ao nível dos indivíduos e dos estados”. O ambientalista e orador sublinhou que os 17 objectivos do milénio – organizados à volta dos cinco P’s: Planeta, pessoas, parcerias, prosperidade e paz – são uma preocupação do nosso país, que dá um exemplo no esforço pela promoção das energias sustentáveis. A propósito do texto do Papa, afirmou que se dirige a toda a humanidade e que apenas o segundo capítulo apresenta os princípios judaico-cristãos, enquanto os outros cinco são uma chamada de atenção universal “para o grito da terra e dos pobres”. No momento de diálogo, recordou que nessa mesma noite os USA – ainda com o resultado das eleições presidenciais por apurar – saia do Acordo de Paris por decisão do agora ex-presidente Donald Trump. Finalmente, animou os participantes a abraçar hábitos de vida sustentável por eles próprios e pelas futuras gerações.

    Vegetarianismo, desporto e novos estilos de vida

    Na terceira conferência, João Rodrigues, nutricionista e bioquímico do IPVC e da Universidade do Porto, discursou sobre “Vegetarianismo, desporto e novos estilos de vida”. O professor universitário começou por referir que “ser saudável não é apenas uma questão individual, mas inclui a sociedade e o planeta”. Recordando que o triângulo da saúde segundo a OMS é formado pelas dimensões física, mental e social, afirmou que um dia poderá passar a incluir a dimensão ambiental. Explicou que uma alimentação saudável implica ter em conta quantidade, qualidade, nutrientes, compostos bioativos (ou superalimentos), antinutrientes, contaminantes e aditivos, entre outras questões. Elucidando que a estrutura biológica do ser humano confirma que é omnívoro (a vitamina B12 só existe no mundo animal e a vitamina D e o ómega 3 quase exclusiavemnte nos peixes gordos), considerou ainda que o “vegetarianismo” é um padrão alimentar possível, com riscos, mas que se podem evitar. Recordou que as motivações vão desde evitar o sofrimento animal, até à moda ou o desejo de ser diferente, mas, principalmente, trata-se de reduzir o impacto na saúde e, também, no ambiente. A título de exemplo, mencionou que a produção de um kg de carne necessita de 15 mil litros de água e a de 1 kg de tomate apenas necessita 214 litros; a produção de um kg de carne emite 27 kg de dióxido de carbono e a de 1 kg de tofu apenas 2 kg de CO2. É um facto que o consumo de carne implica aproximadamente a criação de 8 animais por pessoa cada mês e até 100 por ano. Este e outros padrões podem ter riscos em termos de carências nutricionais, monotonia e custos, mas podem ser superados. Tem vantagens como o maior consumo de fibra e das vitaminas A, B e C, e substâncias antioxidantes e anti-inflamatórias naturais. Quanto ao desporto, recordou a máxima “corpo são em mente sã”. E recordou que a prática de desporto aumenta o espírito competitivo, a definição de objectivos, o menor risco de doenças e lesões e promove o bem-estar físico e psicológico. As desvantagens, como a gestão do tempo e as limitações físicas, podem ser geridas com algum empenho e ajuda. Na verdade, “ser saudável é um acto de cidadania”. Sobre os novos estilos de vida, apresentou o padrão de alimentação chamado “flexitarianismo” que consiste em alternar refeições de carne, com outras vegetarianas, veganas, etc. que é saudável e menos complexo. É, como o seu próprio nome o define, um padrão flexível. Finalmente, apresentou o “climatarianismo” como o padrão de alimentação que pretende ter o menor impacto no ambiente e, por isso, prefere a produção local (“Locavore” e “the global impact of eating locally”), evita o consumo exagerado de carne, reduz as embalagens plásticas e promove a reutilização, evita o desperdício, etc. Isto é, todas as acções possíveis que poupam o ambiente e beneficiam o ser humano. É um padrão “eco-friendly”, de baixa pegada ecológica. Conclui propondo a visita ao seu blog Blog “Mundo da Nutrição” como forma de acesso a sempre novos conhecimentos porque “informação é saber que o tomate é um fruto, mas conhecimento é não pô-lo na salada de fruta…”.

    How dare you?

    Na penúltima sessão, a teóloga Isabel Varanda abordou o tema “How dare you? Desenvolvimento, juventude e futuro da humanidade”. Explicou que o desenvolvimento e o futuro se encontram numa encruzilhada. No entanto, “o futuro é a juventude, que somos todos nós os que vivemos neste tempo”. Referiu que “sinto a alegria de viver num arco de tempo em que foi possível testemunhar a passagem da desmesura antropocêntrica a uma consciência ecológica planetária que configura uma radical mudança de paradigma”. Com contributos de Chantal Delsol, Maurice Bellet, Edgar Morin, nos seus noventa e nove anos, e com as palavras de Zigmunt Bauman, recordou “o perigo de fuga para outros lugares que não o futuro, a retrotopia…”. Neste sentido, a Carta “Laudato Si”, que é de alguma forma redutora por falar em planeta e não em espaço, visto que existe já também muito lixo espacial, e a Carta “Fratelli Tutti” do Papa Francisco são dois gritos pela fraternidade, para recordar-nos que “nem o planeta nem o ser humano é solitário, mas solidário, existe uma solidariedade biológica, uma fraternidade universal, uma biografia comum da criação”. Temos de reconhecer que a “crise de fraternidade pode destruir-nos mais do que o SARS-Covid2”. A humanidade precisa de chorar – afirma o Papa Francisco – e compreender que se, na história actual, não se coloca do lado do samaritano, coloca-se do lado dos salteadores ou dos indiferentes. O planeta não é um kit básico de sobrevivência, um caixote do lixo, mas um espantoso ecossistema global, no qual temos de aprender a reconhecer “Ecce frater”, “eis o irmão”. E, com as palavras de Paulo VI, na ONU em 1965, encerrou afirmando que “eis chegada a hora em que se impõe uma pausa… quase uma oração, para pensar na nossa origem comum, na nossa história e no nosso destino comum”.

    Uma nova obra de misericórdia: por uma Igreja Verde

    A noite de encerramento contou com a intervenção do padre e biblista Pablo Lima, com o título “Uma nova obra de misericórdia: por uma Igreja verde”, na qual recordou os princípios bíblicos e espirituais do cristianismo que promovem uma existência mais sóbria, em defesa de humanidade e da natureza. Começou por explicar que, em 2016, o Papa propôs como “décima quinta obra de misericórdia, corporal e espiritual ao mesmo tempo, “usar de misericórdia para com a nossa casa comum”. Citando textos do Génesis ao Levítico, explicou que a Bíblia possui textos que proíbem explicitamente a crueldade contra os animais e contra as árvores, impõem o mandato do descanso semanal e do jubileu extensível aos animais e às terras de cultivo e não hesita em afirmar o carinho com que Deus olha pelos animais domésticos que, no irónico relato do profeta Jonas, são uma das razões da compaixão divina. Referiu ainda que os textos da Sagrada Escritura, que habitualmente são iconoclastas, não recusam usar simbologia zoomórfica (leão, leopardo, urso, águia, pomba, cordeiro…) para referir-se a Deus e que a profecia por excelência da futura paz escatológica (Is 11,6-9) apresenta a harmonia entre os animais entre si e com os humanos como sinal da perfeita comunhão divina: “O lobo viverá com o cordeiro  (…) o bezerro e o leãozinho brincarão juntos e um menino será o seu guia”.Revisitando brevemente a história do monaquismo oriental (séc. IV) e ocidental (séc. V-XI) e das ordens mendicantes (séc. XII-XIII), recordou que a contemplação da natureza, o cuidado da horta comunitária ou mesmo de um jardim pessoal e uma dieta preferencialmente vegetariana ou obrigatoriamente piscatariana é um traço comum dos movimentos contemplativos cristãos. Conclui citando o Papa que afirma que “a espiritualidade cristã propõe uma forma alternativa de entender a qualidade de vida, encorajando um estilo de vida profético e contemplativo, capaz de gerar profunda alegria sem estar obcecado pelo consumo. É importante adoptar um antigo ensinamento, presente em distintas tradições religiosas e também na Bíblia. Trata-se da convicção de que “quanto menos, tanto mais”» (LS 222) e referindo que autores não religiosos como Matt Haig em “O mundo à beira de um ataque de nervos” e Duane Elgin em “Simplicidade voluntária” baseiam-se nestes mesmos princípios.

    Comissão Laudato Si

    A intervenção contou ainda com a bióloga Diana Fernandes, coordenadora da Comissão Laudato Si’, que apresentou os membros e objectivos desta equipa experimental do Instituto Católico ao serviço da consciencialização dos crentes e das comunidades cristãos para a problemática ecológica, com algumas sugestões concretas e visitas locais, apenas a pandemia o permita.

    Memória Agradecida

    A Semana de Estudos/Ciclo de Seminários começou com uma memória agradecida a D. Anacleto Oliveira, recente e prematuramente falecido, que era uma presença constante nestes serões, e D. José Pedreira, fundador do actual edifício do ICVC e antigo professor da Escola de Enfermagem que antecedeu a actual ESS-IPVC. Com estes dois marcos históricos, esta Semana de Estudos/Ciclo de Seminários irá completar as Bodas de Prata no próximo ano 2021 e os organizadores e participantes fazem votos de que possa voltar a ser, olhos nos olhos, e que a humanidade, solidária e não solitária, se empenhe e supere a crise sanitária e a crise ecológica.

    Tags: Categories: Escola Superior de Teologia, Teologia

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